17.4.10







havia cinco dias, o esquilo que irrompia feito um dardo o elevado de goiabeiras bravas na fissura de algumas sementes para roer não dava as caras. ou de certo dava. para ver os esquilos faz-se inevitável estar aqui. setenta e duas horas de exílio voluntário no sítio São Vicente eu ainda não havia deixado Porto Alegre. para a consciência física, o tempo deve ser um fenômeno estranho àquele em que a circunstância do espetáculo promove uma progressão desacelerada e nada aritmética das horas. no colégio me diziam - o tempo do teatro é outro. pro publicitário, tempo nem é tempo, é prazo. em Araucária o tempo é tudo que se tem. você vai atravessar brumas encantadas de ciano no Terminal Angélica e, se acaso sobreviver ao fedor das emissões industriais, entenderá porque da mercearia do Juca Fila, pra cá, o único comoditie à queimar dentro de um cachimbo é tabaco picado. diferente de Porto Alegre.
minha mulher comenta com doçura o belvedere em frente à casa. segundo sua teoria seria esse mesmo precipício de beleza que me traria de volta ao presente. eu o chamo de consulado do Guaíba pois, exceto pelo fato de mirar para alqueires de campos de soja à perder de vista - às vezes trigais - o sol aqui leva o mesmo tempo para se pôr que o de lá. nunca cronometrei, mas sei o que estou dizendo.
nos dias que seguiram, o tempo não produziu nada além de sí próprio* sendo que não encontrei obstáculo algum à me constranger a conquista dos domínios de uma rotina ritual. o sol vespertino projeta réstias insustentáveis perfazendo todo um picturalismo datado em matizes infinitesimais de um verde lácteo e abundante. na cozinha, o mocca borbulha ascendentemente. apanho a barra de sabão glicerinado, fio navalha, alcool gel com aloe vera ou mesmo loção à base de conhaque vagabundo e faço a barba solfejando "ashes to ashes" com o nariz. lembro vagamente durante minha estadia no Pixel Show, de uma platéia muito jovem aspirando adesão às fileiras estanques do mercado criativo. distribuindo-se sobre os mil e trezentos assentos insuficientes ou ajeitando-se pelo chão com seus netbooks, seus tênis customizados, seus feathercuts, suas sardas, seus aparelhos ortodônticos, sem esquecer dos onipresentes óculos de armação de acetato preto. eu os via carregando três, quatro vídeos do youtube ao mesmo tempo para em seguida assistí-los a cada um até a metade, partindo pra outros sítios engenhosamente construídos para produzir o esquecimento a cada clique. no cyber espaço a leitura não é linear, mas por camadas. cada camada traz em si uma variedade absurda de hiperlinks que o remeterão à outras diversas camadas de informações idênticas e pasteurizadas ad infinitum dentro de pequenos compartimentos que garantirão o modus operandi imprescindível à formação das novas massas críticas - a superficialidade.
contornando a Serra do Mar, enquanto rabiscava alguma coisa no sketchbook, notas de teclado metálico justapõem-se em minhas auditivas portas. começo a sentir falta de uma relação mais low-tech com a produção artística e decido de antemão, mandar minha Olivetti elétrica pro conserto. momento em que me ocorre o estalo de que aqui nessas planuras persiste o paradigma do brainware. neste ambiente de pintassilgos, tucanos, raposas e condores encontram-se armazenadas, em arquivos incorruptíveis, memórias de emoções cujo acesso dá um sentido concreto ao conselho carinhoso do mestre Grampá no rolê pós-conferência - "cara, faz o seguinte: chega em casa e começa a escrever um romance. " no início é duro de tirar uma frase que preste. mas depois da primeira vem a segunda, a terceira... beatitude e abandono produtivo a perder de horas.


* diálogo em off de Antonia's Line (Marleen Gorris - Bélgica,1995)

de cima para baixo: (1) scketch no busão, (2) palestra do Grampá, (3) mostra de cartazes, (4,5) Pixel Show Poa 2010.

8.4.10

on the BR 101


800km é a distância que separa de sua querência este altaneiro no Paraná. Pé na estrada e desta vez para o tão esperado Pixel Show 2010 que acontece em Porto Alegre no próximo fim de semana. Oportunidade para suprir a abstinência cívica junto aos convivas, rever velhos amigos ( em especial o quadrinhista e diretor de arte Rafael Grampá também palestrante no evento), conhecer o novo painel de case criativo , debater os rumos do grafismo contemporâneo e pegar um por do sol no Guaíba. Na mala de garupa: Alexei Tolstoi e John Polidori peleiam por um espaço entre a erva mate e o alecrim.

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